quinta-feira, 4 de junho de 2020


Reflexão II - Relatório
       Prêmio Tuxáua – MinC 2010


dEFICIÊNCIAS e dFORMADORES DE OPINIÃO
As leis não bastam: elas não falam do amor.

José Guilherme Castro e Raimundo Anisseto da Silva

Nos últimos oito anos, o mundo começa a perceber que o Brasil deixa de ser o gandula do jogo e passa a ser um dos principais articuladores do time das grandes nações. Com os passes curtos e lançamentos longos pela paz, com muitos dribles para eliminar a exclusão social, com criatividade e alegria, o país verde e amarelo cria as condições para disputar a camisa 10 desse time.

O Brasil sempre foi o país das imensas riquezas naturais, da maior cobertura florestal, de variadas e abundantes jazidas minerais e de quase 20% da água potável do planeta. É o quinto maior em extensão territorial e população. Faz parte dos 5% dos países com maior circulação financeira, e as previsões indicam que, até o final desta década, deverá ser a quinta economia mundial.

Por causa dessa exuberância, várias gerações ouviram e repetiram a expressão que se tornou popular por aqui, de que "Deus é brasileiro". Jorge Ben Jor, com toda irreverência, cantava: "moro num país tropical, abençoado por Deus, e bonito por natureza". O mesmo argumento, contudo, foi utilizado para incutir na cabeça de uns e outros que seríamos eternamente um gigante adormecido, deitado em berço esplêndido, condenado a um futuro de glórias distantes e incertas, nunca alcançáveis, por sermos um povinho preguiçoso, ignorante e corrupto.

Neste princípio de Século XXI, ao despertar as atenções do mundo, o país está sendo dirigido por um presidente e um vice com trajetórias de profundas deficiências, cujas escolaridades não ultrapassam a metade do ensino fundamental; sendo ambos filhos de pais pobres, e o primeiro mandatário pertencente a família retirante do Nordeste. Por décadas, este que é o Presidente da República, foi tachado de deficiente e incompetente, que quase nunca trabalhou na vida. Das poucas vezes que pegou no pesado, acabou acidentado, perdendo o dedo mindinho da mão esquerda, por descuido.

"A vida não é, ela está sendo" dizia Paulo Freire. O avanço do país comprova essa verdade, além de desconstruir, de forma acelerada, as idéias e valores daqueles (de)formadores de opinião, que não acreditavam (e muitos continuam não acreditando) no Brasil e no nosso povo. O mito do brasileiro preguiçoso e ignorante esvai-se como fino pó, ante a pujança da economia nacional, a criatividade em vários setores e a eficácias comprovada. 

Não nos demos conta de que o futuro será a busca do Autodesenvolvimento!
Não é novidade que Francis Fukuyama estava errado quando disse que estávamos vivendo o Fim da História. Contudo, ainda não nos demos conta de que, possivelmente, a humanidade está vivendo o início de uma "Outra História". O novo paradigma da comunicação, motivado pelas tecnologias da digitalização e as mudanças da matriz energética mundial, estão entre as mais significativas rupturas, que possibilitarão o surgimento do comunitarismo como o modelo da vida futura.

A necessidade de ser forte localmente é uma das premissas para ser forte e ter influência globalmente. A cultura, o meio ambiente e a vida saudável, em todos os sentidos passam a entrar no cardápio, e podem virar gênero de primeira necessidade. Muita coisa tem que acontecer ainda. Mas quem garante que a guerra e a violência não possam ficar fora de moda? Que o sentimento de alteridade não possa nos conduzir? Que cada vez mais a solidariedade não vá deixando de ser apenas uma palavra dita e escrita e passe a ser uma atitude efetiva de milhões de pessoas?

Quando a sociedade da informação supera a "Era do Play" e assume a 
"Era do Enter", o mundo se surpreende com os internautas brasileiros.
Apesar de grande número de brasileiros ainda não navegarem na internet, todas as pesquisas sobre o uso das redes sociais indicam que o Brasil é o país que reina nessas mídias, de forma que o país do futebol pode também ser considerado a nação das redes sociais, conforme relatório da Nielsen 

O Brasil já tem a alternativa energética que os outros países procuram.
Para usar os combustíveis fósseis precisamos extraí-los. Já a biomassa, pode ser simplesmente colhida. Mas só vamos colher o que plantarmos. Trata-se muito mais uma relação de cuidar do que de explorar. Os primeiros não dão duas safras, pois são resultado de milhões de anos de transformações que geraram o petróleo, o gás e o carvão mineral. Já a biomassa, nos países tropicais, pode dar até 3 safras por ano. É o caso, por exemplo, do girassol, e outros grãos, raízes e gramíneas, como a mandioca, batata doce e cana de açúcar, que permitem a colheita antes de completar dois anos.

Energia Renovável 2/6: www.youtube.com/watch?v=OzOPusidgow HYPERLINK
Energia Renovável 3/6 www.youtube.com/watch?v=4djePfyGiE4 HYPERLINK
Energia Renovável 4/6  www.youtube.com/watch?v=Gwm5ki_dzC0 HYPERLINK

A indústria petrolífera é extremamente concentradora e poluidora, não gera um milhão de empregos para extração e refino. Enquanto isso, a Escola da Biomassa surge da crítica dos pontos falhos do ProÁlcool. Entre eles “a utilização de métodos de economia de escala aplicados a um recurso natural disperso como é a biomassa, que tem o germe da deseconomia de escala. A escala gera a monocultura, a concentração de produtos rejeitados e problemas de segurança alimentar”, como alertou Gilberto Felisberto Vasconcellos, em seu clássico “Biomassa: a eterna energia do futuro”. Assim, quanto mais desconcentrada, mais será produtiva.

Com 30% da área agricultável dos países tropicais, é possível plantar, colher e produzir o suficiente para substituir o consumo mundial de diesel e gasolina por biodiesel e álcool, toda a petroquímica pela alcoolquímica. Essa mudança iria gerar cerca de 240 milhões de postos de trabalho de qualidade superior aos da metalurgia, e quase um bilhão de empregos indiretos. Sendo a grande maioria na África e América do Sul, nas regiões topicais, as áreas mais empobrecidas do planeta. 

Na mudança da matriz energética mundial, durante o século XVIII, quando passou-se a utilizar os combustíveis fósseis, era a Inglaterra que detinha tecnologia de ponta em extração e processamento do carvão mineral, e os EUA, no século XX, da extração e do refino do petróleo, e do desenvolvimento da petroquímica.

Com a escassez das reservas de petróleo e a, cada vez maior, consciência dos danos ambientais que os combustíveis fósseis provocam, veremos novamente uma nova mudança da matriz energética mundial. Agora é o Brasil quem detém a tecnologia de ponta para a produção da energia da biomassa e da alcoolquímica. Durante o período de transição, a Petrobrás é a empresa mais avançada do mundo em pesquisa e perfuração em águas profundas, onde se encontram as últimas grandes reservas de petróleo. 

No passado, a Inglaterra e os EUA utilizaram suas riquezas naturais, conhecimento e as habilidades dos seus povos para se tornarem nações imperialistas espalhando violência, mutilações, exclusão, miséria e mortes mundo afora. Com firmeza, cada vez mais o Brasil vem mostrando que nossa vocação é pela vida. Que o diálogo é a melhor arma que a humanidade tem para resolver conflitos; que vale a pena utilizar tecnologias e descobertas cientificas como munição para a eliminação da pobreza. A cada dia que passa mais nos credenciamos como grande ator da construção do entendimento e da sinalização dos caminhos da inclusão. 


O Brasil certamente está mudado e mudará mais. A grande maioria da população acredita que ele melhorou; alguns acham que está menos pior; um número pequeno diz que está igual, e é difícil encontrar alguém que fale que piorou.

O Brasil acaba de dar uma grande lição, comprovando que cuidar dos pobres e muito pobres não é despesa e sim investimento. Como disse o presidente Lula: “a resposta das classes C e D foi o principal instrumento que transformou a crise financeira mundial em marolinha em nosso país. Neste período, quando quase ninguém queria comprar, foram eles os maiores consumidores”. Assim como esta, o Brasil pede passagem para dar outras contribuições de humanização da humanidade.

O preconceito que existe em relação aos muitos pobres, sempre foi aplicado com uma intensidade incalculavelmente maior, em relação às pessoas com deficiência. A cegueira, surdez, paralisia e loucura do mundo dominado pelos “eficientes”, até hoje foi incapaz de perceber a grande contribuição que pessoas com talentos e eficiências ESPECIAIS podem nos proporcionar. Existem países que oferecem melhores condições a essas pessoas; outros, piores. Mas em qualquer parte do planeta, as pessoas com deficiência, quando são tratadas como cidadãos, são cidadãos de quinta categoria. 

As pessoas com deficiência visual, auditiva, física ou com transtorno mental, não entram na nossa roda, não sentam na nossa mesa de bar e nem de restaurante, não vão para o clube, praia, cinema, teatro, luau e nem sarau com a gente. Também não vão para festas, futebol, carnaval, e muito menos viajam com a nossa turma. Aliás, não temos amigos com essas deficiências, não temos intimidade com esse povo. Nosso convívio com eles se restringe às novelas das 8 na rede Globo.

Por mais sensíveis que sejamos, na prática acabamos tratando-os como pessoas que não tem alma, consciência política, sensibilidade artística e capacidade de produzir. Agimos como se eles não devessem receber investimentos e muita atenção, pois só dão despesas e trabalho, não nos fazem companhia e nos roubam a solidão. Aqueles que conquistam um lugar no nosso convívio precisam ser melhores que a média dos que se acham normais, e precisam ficar muito espertos, pois só assim são tratados como iguais. Não somos nós que abrimos as portas, são eles que as arrombam.

Na maioria das atividades, inclusão se limita a duas perguntas na ficha de inscrição: É Deficiente:    (  ) Sim ou (  ) Não e Qual:___________ e a um tradutor de libras no palco ou telinha do telão. Na maioria das vezes não tem nenhum participante com deficiência auditiva, quase nunca encontramos publicação em Braille e muito menos facilidade de acesso para caiderantes e os que possuem dificuldades de locomoção. Qualquer participante que sofrer um surto, provavelmente estará condenado ao Haldol e internação em hospícios públicos ou em clinica psiquiátrica privada.

A OMS estima que cerca de 10% da população de qualquer país em tempo de paz é de pessoas com deficiência, os dados do IBGE, indicam cerca 15% no Brasil (atualização: no último senso 23,9% declararam ter pelo menos uma deficiência). Mas onde estão as mulheres com deficiência no movimento de mulheres? Onde estão os negros com deficiência no movimento negro? Onde estão os militantes com deficiência nos movimentos sindical, Sem Terra, Sem Teto, ambiental, economia solidária? Nestes, nos demais outros movimentos sociais, como também em todas outras áreas da sociedade, sejam universidades ou empresas, em quantidade eles são a exceção para confirmar a regra, e na qualidade dos cargos não chegam a gatos pingados.

Nem mesmo as igrejas parecem ter salvação. Não existem pastorais, cultos, atividade especial para eles em nenhuma delas seja Católica, Evangélica, Espírita, Afrodescendente ou qualquer outra. A acessibilidade nos templos não vem da consciência humanitária, mas sim da fiscalização urbanística e do corpo de bombeiros.

No Estado, a calamidade não é diferente. Apesar dos atletas brasileiros estarem entre os maiores medalhistas das Paraolimpíadas, no sítio do Ministério dos Esportes aparece zero vezes zero quando fazemos uma busca com as palavras: pessoas com deficiência, deficiência física ou até mesmo Paraolimpíadas. 

Apesar de ser quase impossível, é mais fácil achar fotos de negros nas colunas sociais dos jornais brasileiros, de que referência às pessoas com deficiência nas publicações do valoroso IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - vinculado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, órgão mais progressista e atualizado do Estado brasileiro. Se o IPEA, cujas “atividades de pesquisa são de fornecer suporte técnico e institucional às ações governamentais para a formulação e reformulação de políticas públicas e programas de desenvolvimento brasileiro” é assim, o que podemos esperar dos demais órgãos?

Além da crueldade de que estamos sendo cúmplices, estamos também deixando de desfrutar das valiosas contribuições estéticas e de comportamento que as pessoas com talentos e eficiência especiais tem para nos oferecer. Isso sem falar no prejuízo econômico por mantermos esta população fora do mercado de trabalho.  

O Brasil está entrando em um momento em que será necessário contar com muita força de trabalho. Melhor do que importar milhões de chineses, por exemplo, é criar situações para aproveitar as potencialidades dos cerca de trinta milhões de pessoas com deficiências para ocupar parte desses postos de trabalho. 

A falta de estrutura para atender as pessoas com deficiência – cerca de 15% da população (atualização: 23,9%) - acaba limitando também a produtividade de no mínimo mais outros 25% da nossa população: para cada pessoa com limitação, existem no mínimo mais de uma que acabam sendo afetadas devido às deficiências da sociedade para com eles.

O Brasil tem as vantagens relativas para mostrar ao mundo que investir nas pessoas com deficiência faz bem para a saúde do planeta em vários sentidos. Desafio este que podemos tirar de letra, pois a bola já está rolando a nosso favor: O caloroso povo como cenário, e a Copa do Mundo de 2014, Olimpíadas e Paralimpíadas em 2016 são um grande palco. Porém não podemos nos contentar com ações só de fachada, pois assim como o manicômio não é só o de concreto, acessibilidade não se limita só no concreto a rampas de acesso.

Portanto é preciso ajudar a humanidade a acordar desse pesadelo, em que todos perdemos. É urgente iniciar ações que busquem minimizar ou até mesmo interromper sofrimentos tão desnecessários.

Em Minas Gerais, um grupo de pessoas comprometidas com mudanças efetivas, deu os primeiros passes da partida ao elaborar e aprovar, junto ao Ministério da Cultura, os projetos "Ponto de Cultura Talentos & Eficiências Especiais" e o "Pontão de Cultura da Solidariedade". Existem outros bons jogadores espalhados Brasil afora, alguns já veteranos, cheios de experiência, e outros, que apesar de novos, já comprovaram que são bons de bola. Todos eles estão cheios de garra e querendo mostrar suas capacidades, habilidades e criatividade. É preciso juntar esse pessoal, fazer alguns treinos coletivos para entrosamento e ir para o abraço. O importante é que a cada competição que a gente vencer, o mundo inteiro vai ganhar. 

O nosso time é empolgante e a nossa torcida, ainda pequena, é suficiente para nos apoiar nas dificuldades iniciais. Nada a temer: quando o mundo assistir aos lances nunca vistos e às jogadas de solidariedade e superação que ainda não teve chance de ver, vamos conquistar mentes e corações de muita gente.

Temos um excelente cenário e palco para começarmos a preparar o terreno e ir juntando o nosso time de artistas. Não será preciso muito treino para formar uma boa equipe para começar a atuar na Copa das Confederações, no Brasil, em 2013 e na Copa do Mundo de 2014. Em 2016, sem dúvida, o Rio de Janeiro e o Brasil sediarão, além das Olimpíadas e Paralimpíadas, o maravilhoso e contagiante espetáculo da solidariedade.